O implante coclear ou “ouvido biônico” é um aparelho eletrônico digital de alta complexidade tecnológica, que tem sido utilizado para restaurar a função auditiva nos pacientes portadores de surdez severa a profunda que não se beneficiam com o uso de próteses auditivas convencionais.
Trata-se de um equipamento eletrônico computadorizado que substitui a função do ouvido interno de pessoas que têm surdez total ou quase total. Assim, o implante estimula diretamente o nervo auditivo através de pequenos eletrodos que são colocados dentro da cóclea. Estes estímulos são levados via nervo auditivo para o cérebro.
É um aparelho muito sofisticado e é considerado uma das maiores conquistas da engenharia ligada à medicina do nosso século. Foi lançado há alguns anos e já beneficia mais de 400.000 pessoas no mundo, sendo contabilizados mais de 8.000 usuários só no Brasil.
Quais são as partes que compõem o implante coclear?
O implante coclear é composto por duas partes:
A unidade externa é constituída por um processador de fala, uma antena transmissora e um microfone.
A unidade externa é a parte do implante que fica aparente e pode ser de dois tipos:
A antena transmissora possui um imã que serve para fixá-la magneticamente junto à antena da unidade interna (que também possui um imã).
O microfone capta o som do meio ambiente e o transmite ao processador de fala. Este seleciona e analisa os elementos sonoros, principalmente os elementos da fala, e os codifica em impulsos elétricos que serão transmitidos através de um cabo até a antena transmissora. A partir da antena transmissora, o sinal é transmitido através da pele por meio de radiofrequência e chega até a unidade interna.
É implantada cirurgicamente dentro do ouvido do paciente.
Esta unidade possui um feixe de eletrodos que será posicionado dentro da cóclea (órgão da audição com formato de caracol).
O feixe de eletrodos conecta-se a um receptor (decodificador) que ficará localizado na região atrás da orelha, implantado por baixo da pele.
Junto ao receptor ficam a antena e o imã que servem para fixar a unidade externa e captar os sinais elétricos.
O receptor estimulador contém um “chip” que converte os códigos em sinais eletrônicos e libera os impulsos elétricos para os eletrodos intracocleares, estimulando diretamente as fibras no nervo auditivo. Esta estimulação é percebida pelo nosso cérebro como som.
Desse modo, o paciente recupera parte da audição e pode voltar a se comunicar com as pessoas.
O paciente candidato ao implante coclear é aquele que possui perda auditiva bilateral de severa a profunda e que fez uso de próteses auditivas, mas não se beneficiou do seu uso.
Nós dividimos os pacientes em dois grupos que apresentam indicações e resultados bastante distintos.
No primeiro grupo, estão os pacientes pós-linguais, ou seja, pessoas que escutavam e que perderam a audição após desenvolvimento da fala.
No segundo grupo, estão os pacientes pré-linguais, pessoas surdas desde o nascimento ou que perderam a audição antes do desenvolvimento da fala.
Em casos selecionados, pacientes com surdez unilateral.
Perda auditiva neurossensorial bilateral de grau severo a profundo sem benefício com o uso do aparelho de amplificação sonora individual (AASI), ou seja, pacientes que apresentam escores inferiores a 50% em testes de reconhecimento de sentenças com o uso da melhor protetização bilateral possível.
Não existe limite de tempo para a realização do implante coclear neste grupo, porém quanto maior o tempo de surdez, em geral, piores serão os resultados.
Perda auditiva neurossensorial bilateral de grau severo a profundo, com reabilitação fonoaudiológica efetiva há pelo menos 3 meses (crianças de 0 a 18 meses) ou desde a realização do diagnóstico (crianças maiores de 18 meses), e que não se beneficiam com o uso do aparelho de amplificação sonora individual (AASI).
Nas crianças, a faixa etária ideal é até 2 anos de idade, e quanto mais precoce for o implante, melhores serão os resultados.
Entre 2 e 5 anos, os resultados também podem ser bons, porém são inferiores aos pacientes implantados até os 2 anos.
A partir dos 5 anos, os pacientes também podem ser implantados, mas os resultados dependerão de outros fatores como o grau de desenvolvimento da linguagem já adquirida e do trabalho de estimulação auditiva prévia – uso de prótese auditiva, capacidade de realização de leitura orofacial e linguagem de sinais.
Em adolescentes e adultos com surdez congênita (de nascença), o implante terá algum benefício se o paciente for oralizado. Aqueles que se comunicam exclusivamente por LIBRAS têm pouco benefício e geralmente não se adaptam ao implante.
A descrição dos critérios com maiores detalhes pode ser conferida no seguinte endereço eletrônico:
Em casos selecionados, de acordo com avaliação da equipe médica e fonoaudiológica, outros pacientes poderão ter indicação fora desses critérios. Pacientes com surdez neurossensorial unilateral, em casos selecionados, podem apresentar indicação de implante coclear.
É fundamental que os pacientes e familiares tenham pleno conhecimento de como funciona o implante, das suas limitações, e que haja envolvimento e disponibilidade para cumprir todas as etapas do tratamento.
O implante coclear é um processo complexo que exige a atuação conjunta de uma equipe multidisciplinar (vários profissionais de especialidades diferentes) para que se alcance o sucesso do tratamento.
A equipe é composta por um médico otorrinolaringologista, um fonoaudiólogo e um psicólogo (todos os membros da equipe têm que ter especialização em implante coclear).
A avaliação do paciente candidato ao implante coclear é um processo complexo e pode ser demorado, pois existem etapas que devem ser obrigatoriamente seguidas e cumpridas para que seja conseguido o melhor resultado possível em benefício do paciente.
É muito importante que a equipe escolhida pelo paciente tenha experiência e estabilidade, devendo ser formada por profissionais comprometidos com a Instituição que trabalham, uma vez que o paciente implantado terá que ter apoio dessa equipe por toda a vida.
Profissionais isolados que não tenham equipe consolidada ou que sejam apoiados por empresas produtoras ou distribuidoras de implantes não são recomendados.
A equipe deve ter experiência no tratamento dos diversos tipos de surdez, com outras soluções, além do implante coclear, como adaptação de aparelhos auditivos, tratamento de outras doenças que afetam a audição, e não ser somente “implantadores”.
Como trata-se de um equipamento médico de alto custo, os pacientes e suas famílias devem estar atentos com propagandas e abordagens realizadas diretamente pelas empresas, sob a forma de encontros ou mesmo nas redes sociais, utilizando “embaixadores” ou pacientes implantados que apregoam que tal marca é melhor que a outra.
Esta abordagem não é ética e pode induzir a uma escolha inadequada.
O ideal é que o paciente e sua família escutem a indicação da equipe que foi escolhida para fazer o implante, pois ela é a única que vai oferecer apoio durante toda a vida e responder pelos resultados do tratamento.
O paciente deve ser avaliado, inicialmente, pelo médico otorrinolaringologista para o diagnóstico da causa, do tipo e da gravidade da surdez.
O médico avalia se a causa que levou à surdez permite que seja realizado o implante coclear.
Também é importante que seja estudada a existência de outras doenças, pois o paciente deve ser avaliado como um todo e não apenas a audição.
A próxima etapa é a avaliação pela fonoaudióloga, que realizará testes auditivos, de linguagem e exercícios que prepararão o paciente para receber o implante coclear.
O tempo dessa avaliação é variável, pois depende da motivação do paciente. Ela é composta por:
–Avaliação do grau de surdez: temos que ter certeza que a surdez é mesmo profunda.
–Avaliação da adaptação do paciente com a prótese auditiva convencional: temos que ter certeza de que a prótese convencional já não é suficiente para atender às necessidades do paciente.
–Avaliação de linguagem emissiva (fala, uso de linguagem escrita e por meio de sinais – em pacientes já alfabetizados) e receptiva (realização efetiva de leitura orofacial, uso de linguagem escrita e por meio de sinais).
Quando algum destes aspectos não é satisfatoriamente atendido, o paciente pode ser encaminhado, a princípio, para reabilitação fonoaudiológica, e posteriormente é reavaliado.
Neste período, poderão ser necessários:
–Treinamento em leitura orofacial para crianças maiores e adultos : Este treinamento é essencial na fase pré-implante e muda significativamente o resultado final, quando bem realizado.
–Treinamento auditivo : melhora, muitas vezes, o desempenho do paciente com a prótese convencional, ou o resultado final com o implante.
– Terapia de estimulação de linguagem
É muito importante que sejam avaliados os aspectos psicológicos do paciente e das pessoas que convivem com ele no dia a dia.
É imprescindível que o psicólogo avalie se o paciente está preparado para a cirurgia, se aceita o convívio com uma prótese implantada dentro da cabeça e se os familiares estão motivados e apoiam esta decisão (nós consideramos o apoio e a participação da família fundamentais).
Devemos avaliar também o grau de expectativa do paciente e se ele tem consciência dos resultados que podem ser atingidos. O paciente deve estar ciente de tudo o que está acontecendo e a equipe deve expor tudo de uma forma clara e sincera, pois nós acreditamos que uma relação de confiança mútua entre o paciente e a equipe seja fundamental.
Por fim, o paciente é submetido a uma avaliação pré-operatória para que sejam avaliados todos os possíveis riscos cirúrgicos e para que a cirurgia seja realizada da forma mais segura possível.
– Audiometria completa.
– Audiometria em campo com uso de AASI (aparelho de amplificação sonora individual)
– BERA (Potencial evocado de tronco cerebral)
– Emissões otoacústicas
– Tomografia computadorizada de ossos temporais
– Ressonância magnética de ossos temporais
Os pacientes usuários de implante coclear devem ser vacinados contra meningite, pois apresentam risco 30 vezes maior de contrair essa doença quando comparados com a população geral. O feixe de eletrodos do implante coclear funciona como uma via de propagação de infecções da orelha média para dentro da cóclea e, a partir daí, para as meninges, levando à meningite. O principal agente envolvido nos casos de meningite relacionada ao implante coclear é uma bactéria chamada Streptococus pneumoniae ou simplesmente pneumococo.
As principais vacinas a serem administradas, portanto, são as vacinas anti-pneumocócicas, comercialmente conhecidas como Prevenar® (a partir de 6 semanas) e Pneumo 23® (maiores de 2 anos). O objetivo é prevenir a ocorrência de otites que possam infectar o feixe de eletrodos do implante e, consequentemente, levar à meningite.
A vacina Pneumo 23 deve ser repetida uma vez após 5 anos.
Existe uma divergência entre a recomendação do CDC (Center of Disease Control) americano e do Ministério da Saúde brasileiro quanto a esta recomendação. A vacinação contra meningite tipo C e gripe não são preconizadas nos EUA, somente no Brasil.
A meningite tipo C não causa otite e, portanto, não teria relação com o implante coclear, mas a vacinação é obrigatória no Brasil.
Já a vacinação contra gripe visa prevenir a ocorrência de otite média, não pelo vírus da gripe, mas por uma infecção bacteriana secundária a um quadro gripal. Deve ser aplicada anualmente, no início do outono, pelo resto da vida.
Todas estas vacinas são administradas gratuitamente para todos os usuários de implante coclear, ou que estão prestes a realizar a cirurgia, sendo exigido apenas um receituário médico com a justificativa: “usuário de implante coclear”.
Recomendações do CDC americano:
– vacina contra pneumococo
– vacina contra hemófilos
Recomendações do Ministério da Saúde brasileiro:
-vacina contra pneumococo
-vacina contra hemófilos (menores de 19 anos não vacinados)
-vacina contra meningococo tipo C
-vacina contra gripe (influenza)
OBS: As vacinas administradas e o esquema vacinal variam de acordo com a idade do paciente.
Fonte: manual do centro de referência em imunobiológicos especiais – ministério da saúde: https://www.saude.pr.gov.br/arquivos/File/-01VACINA/manual_crie_.pdf
A unidade interna do implante é colocada através de uma cirurgia que tem duração aproximada de 2 horas.
É realizada sob anestesia geral, ou seja, o paciente estará entubado e inconsciente, e não sentirá nada durante todo o procedimento.
1) O corte (incisão): É realizado na pele atrás da orelha com um tamanho de aproximadamente 4 cm.
2) Colocação dos eletrodos: É realizada uma abertura na cóclea (órgão da audição com formato de caracol) e os eletrodos são inseridos dentro da cóclea perfazendo uma volta completa em seu interior.
3) Fixação do processador interno: o processador interno é colocado embaixo do couro cabeludo, atrás da orelha (o paciente sentirá uma pequena elevação no local).
4) No final da cirurgia, fecha-se a pele com pontos, e um curativo compressivo é colocado no local.
Riscos da cirurgia
Os riscos inerentes à cirurgia de implante coclear são pouco frequentes, mas podem ocorrer.
Abaixo, listamos alguns desses riscos:
–Insucesso na colocação do implante coclear: pode ocorrer se houver alteração anatômica no ouvido do paciente, seja por um defeito congênito (de nascença) ou por sequelas de infecção e/ou fraturas.
–Infecção e necrose da pele: decorre do fato de se colocar uma prótese sob a pele. Pode ser tratada, quando diagnosticada precocemente.
–Tontura: Pode ocorrer porque o ouvido é responsável tanto pela audição quanto pelo equilíbrio, mas é uma complicação transitória que melhora rapidamente em poucas semanas.
–Paralisia facial: é a complicação mais temida. Pode ocorrer porque o nervo que faz a mímica da face passa muito próximo ao local da cirurgia. Para diminuir o risco desta complicação, é utilizado um aparelho chamado monitor de nervo facial no intraoperatório. Esta complicação, apesar de possível, é muito rara e geralmente melhora após algumas semanas de tratamento.
–Meningite e fístula liquórica: Foram complicações que ocorreram no início dos implantes cocleares. Atualmente, são raras.
Rotina pós-operatória
Na maioria dos casos, o paciente recebe alta no dia seguinte à cirurgia.
O curativo compressivo com faixa fica por 72 horas e os pontos são retirados em 2 semanas.
A ativação do implante coclear ocorre 30 a 40 dias após o procedimento. Em seguida, inicia-se o processo de programação e adaptação do paciente ao implante coclear em consultas com a fonoaudióloga. Essas avaliações são semanais, no inicio, e posteriormente tornam-se quinzenais e mensais.
Cuidados no pós-operatório
Não lavar a cabeça por 3 dias. Após 3 dias, lavar com cuidado para não deixar entrar água dentro do ouvido operado, protegendo-o com um tampão até o retorno com o cirurgião.
Dormir com o ouvido operado para cima por 14 dias.
Não fazer esforço físico ou tomar sol por 30 dias.
Não deixar de tomar corretamente a medicação prescrita pelo médico e não deixar de comparecer no retorno pós-operatório.
Não há restrições quanto à alimentação.
Se fizer uso de prótese auditiva no outro ouvido, pode colocá-la logo no primeiro dia após a cirurgia.
O dispositivo é ativado no consultório da fonoaudióloga de 4 a 6 semanas após a cirurgia. Este tempo é necessário para adequada cicatrização.
A fonoaudióloga irá acoplar o processador de fala ao computador e, utilizando-se de dados obtidos durante a cirurgia, irá ajustar parâmetros como intensidade de estímulo e velocidade.
O tempo médio do processo é de 2 horas.
A reação inicial na ativação do implante varia muito, sendo sempre um momento de bastante ansiedade não só para o paciente e sua família, mas para todos os profissionais envolvidos.
O processador de fala é posicionado atrás da orelha, conectado pela antena imantada à unidade interna e ligado (ativado). Em seguida, alguns testes são realizados em busca da sensação auditiva do paciente e de sua reação a estes estímulos.
Em adultos pós-linguais (que perderam a audição depois de certa idade), a ativação costuma ser mais tranquila, pois o cérebro já estava acostumado a perceber o som antes do advento da surdez. Os resultados são mais rápidos e geralmente é possível atingir alta porcentagem de reconhecimento de palavras, frases e sentenças.
Nos casos de crianças com surdez congênita (nascença), adolescentes e adultos com surdez pré-lingual (que nunca ouviram) é comum que esse seja um momento de estranheza e mesmo desconforto. Como o cérebro não esta acostumado a perceber o som, trata-se de um estímulo novo, que pode ser interpretado pelo paciente de várias formas. Em bebês, a reação é bastante sutil, podendo ser apenas uma alteração no olhar, um choro ou um virar de cabeça. Nas crianças maiores, adolescentes e adultos pré-linguais, é comum o relato de percepção do som como uma vibração.
O implante coclear é uma prótese que pode quebrar se houver algum traumatismo.
O paciente implantado não deve praticar esportes violentos como lutas ou outras atividades com grande risco de bater a cabeça.
É proibido:
Podem ser realizados:
Podem alterar o funcionamento do implante coclear: